quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Sweet Jardim

Era um lugar meio complicado de ser dizer como era. Ou onde ficava. Ou se existia.
Era uma casinha velha, do tipo casinha-velha-dos-anos-50-no-interior-dos-Estados-Unidos. Tinha um lago grande que ela não sabia onde dava porque tinha medo de água. Também tinha muitas plantas iguais, que ela não sabia como chamavam, mas que eram finas e balançavam com o vento forte que sempre fazia. A casinha era feita com madeira gasta, que ela acreditava ter sido pintada de verde. Na verdade, parecia azul, mas ela enxergava verde, pois assim queria, então assim era. Tinha janelas brancas, também bem velhas, gastas e sujas, com praticamente todos os vidros quebrados e um balanço de dois lugares na varanda. Um balanço branco de dois lugares intacto na varanda.
Ela se lembra que chegava sempre muita cansada do ballet, fechava os olhos e, quando abria, se encontrava lá. Então, com suas pernas longas e ossudas, corria em direção ao balanço branco de dois lugares. Deitava nele, amassando seu tutu e desfazendo seu coque. Os cabelos laranja, quase castanhos - ainda hoje há quem diga que ela nunca foi ruiva, que sempre foi "castanha", que "teve a infelicidade que puxar a parte castanha da família do pai"- assim, meio que de uma cor feia, mas com ondas que aludiam imediatamente o movimento do mar, ficavam bonitos vistos de longe.
Era uma imagem bonita de se ver, aquela menina com pernas longas demais e finas demais para seu corpo, sonhos grandes demais para essa vida, deitada naquele balanço branco de dois lugares, sentada com uma perna esticada e a outra dobrada, cantarolando algo como "I see the moon and the moon sees me...", seguindo o vento com a cabeça e com o coração, desejando com todas suas forças se desintegrar para seguir, eternamente, seu movimento.

para ler ouvindo: Tiê - Sweet Jardim